O Poder de se Reinventar!

A gente inventa um tempo, planeja, decide.
 Organiza e se prepara.
 Veste-se de expectativas.

Aí vem a chuva, o pneu fura, a meia calça rasga.
 A gente gagueja, perde o vôo, perde a fala
 Ouve um não e acha que é o fim,
 que tudo está acabado, fadado a terminar assim.

O mundo de repente fica cinza.
 O coelho foge da Lua.
 Nenhum lugar é confortável, nada é interessante.

A chuva vai caindo
 e da janela dá pra ver tudo que ela vai destruindo:
 os enfeites de papel crepon, os bonequinhos de papié maché,
 os vazinhos de argila e a varinha de condão de cartolina.

As pessoas correm,
 num êxodo tresloucado e nem se lembram da menina.
 Ela fica ali parada.
 Com o vestidinho encharcado
 vendo toda a confusão, olhando pro nada.

A menina chora.
 Alguém tenta falar com ela, tirá-la da tempestade,
“venha para o coberto, você vai se resfriar”.
 E a menina chora.

Arranca do bolo destruído
 aquela velinha apagada
 e sai correndo sem rumo,
 sozinha e toda molhada.

Corre, corre, corre.
 Chora sem sairem lágrimas. 
Grita, esbraveja, não entende.
 Dá soco no ar, murro na árvore,
 pontapé na grama e aquilo não passa.
 A menina não sabe o que sente, nem sabe deixar de sentir.

O tempo passa.
Todos os anos, por toda sua vida nos seus aniversários,
 alguém relembra a história e conta dando risada.
 Ela faz que nem lembra direito
 e finge que acha engraçado.

Mas ela sabe que a chuva é doída,
 muito mais do que molhada,
 quando cai apagando a chama de uma vela que era encantada.

Ela estava de olhos fechados, fazendo o pedido mágico:
 queria ganhar uma estrela.
 E a chuva apagou seu sonho,
 com uma gota certeira.

Hoje é aniversário dela,
 ela não quer bolo e nem vela.
 Quer agora um cometa que a leve de volta pro seu planeta
 que é menos chuvoso e bem mais perto do céu.

Olhando da janela, ela faz o novo pedido
 e sabe que será atendido.
Então ela continua escrevendo,
 inventando a história perfeita
 era uma vez uma menina que tinha uma estrela
 que morava no teto do seu quarto.

Hoje a menina não é mais menina,
 não tem medo da chuva, não faz planos,
 não usa relógio, nem se organiza com antecedência.
 Ela é dona da sua história e de muitas outras estórias. 

 Cria essências, tempos e espaços.
 Faz um arco-íris aparecer e um cachorro falar,
 uma borboleta ir à escola e um lápis dançar.

Uma estrela ela nunca teve, mas tem o dom de encantar.
 Sonha alto, escreve tudo e ensina a sonhar.

A menina, que agora é mulher,
 aprendeu a se deixar levar,
 aceitar todos os seus “eus” e jamais ter medo de mudar.
Ela descobriu sua missão:
 tocar vidas com sua caneta encantada
 e devolver a elas o poder de se reinventar!



Fonte:
Título original: A chuva e a Menina de Paula Santomauro
Blog Saltitando com as Palavras

Tags:
Chuva, menina, mulher, sonho, aniversário, borboleta, cachorro , reinventar.